terça-feira, 31 de outubro de 2017

simple things

coisas pequenas e simples, aleatórias, que têm um gosto especial quando se está de baixa em pós operatório duma operação à coluna, partindo das premissas que não me posso baixar ou dobrar:
. pôr loiça máquina- tudo o que é para a prateleira de baixo, é o A que pôe, mas os talheres parece-me que é demais deixar para ele... confesso, não estou habituada a que façam coisas por mim! então, com a prateleira de baixo toda para dentro porque não a consigo puxar, atiro o talher para o cesto (já vos contei que dividimos os talheres no cesto da máquina? tudo a aumentar o grau de dificuldade). a maioria das vezes o talher não fica em nenhuma das divisões do cesto, cai para o fundo da máquina, e é o A que tem depois de o apanhar.
. virar-me na cama - claro que felizmente vai melhorando..
. ver séries numa cadeira rija - as séries não vêm com um sofá e mantinha? como é que se consegue ver e se necessário chorar, quando estamos a ver uma série com o rabo dorido numa cadeira dura?
. ir à casa de banho: se baixarmo-nos para sentar dói, se fazer uma força (aparentemente mínima) para o xixi sair dói, se levantar dói... imaginem o resto!
. espirrar - esta, até agora, está no topo! não é top 5 ou 3, é mesmo O TOPO. começamos com aquela comichão e ardor na cana do nariz, se espirro dói, se travo o espirro vem mais dois ou três de seguida, mas no milésimo de segundo deste pensamento, atrasei-me e o espirro está prestes a sair, ainda o tento travar ao mesmo tempo que me agarro a qualquer coisa que seja que me ajude a estabilizar os ossos para o que aí vem. aquela zona lombar, entre o rabo e os pulmões, aquela onde eu fui operada, afasta-se e junta-se, a dor é aguda e forte, ataca os rins, os músculos verticais ao lado da coluna, aqueles que foram mexidos na operação e que mal consigo tocar, gritam de dor e ficam vários minutos a latejar, como se tivesse soluços, cada soluço sua dor. e finalmente os agrafos lembram-me que existem, que estão lá, que ainda vou ter de passar pelo momento de os tirar, o espirro vem e a pele estica, fazendo lembrar plasticina velha com um prego ferrugento lá no meio, porcausa dos espirros e dos agrafos, pelo sim pelo não ontem fui à Clínica aqui perto, pedir à enfermeira que me mudasse o penso para ver se algum ponto estava inflamado. não estava (graças a Deus), é só a pele e a carne a esticar a cada espirro junto de um arame dobrado de ferro.

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

sem vos ter aqui

passa das onze da noite, entro no quarto dos meus filhos. os estores estão abertos, sinto o quarto frio sem a vossa respiração. tenho medo de vos ter cá e não ser capaz de fazer algo se se aleijarem ou se me aleijarem. tenho saudades enormes e sentimentos de culpa estúpidos por não poderem estar aqui. hoje quando viemos do hospital passámos pela casa da minha mãe para vos ver. o vosso olhar quando me viram!!!!! as vossas mãos a darem-me "abraços de cara" que são aqueles em que as mãos apertam as bochechas com força e os beijinhos são dados quase ao pé dos lábios. o vosso calor e cheiro.
a D percebeu porque não veio, ficou triste. o S não percebeu porque não veio, senti-o confuso e triste.
consegui não chorar à frente deles, e agora passeio pelo quarto deles na esperança que já tenham passado mais dias e eles já estejam ali a dormir no nosso ninho.

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

done it!

aconteceu. está feito. e segundo a minha mente, quando o segundo dia passa, o pior já passou. fui operada à coluna!

o A subiu comigo para o andar da operação, quando já não me podia acompanhar, acho que me deu um beijo. continuaram a levar a minha maca e eu sorri-lhe e acenei. como estava sem óculos e sem lentes, não sei qual foi a reação.
já me tinha dito muitas vezes que ia tudo correr bem.
já lhe tinha dito muitas vezes que ia tudo correr bem.
e assim, apesar dos nervos, mas certa de que ia tudo correr bem e certa de que ele não queria falar das maiores maluqueiras que as minhas que lhe passavam pela cabeça, apenas pude oferecer o meu melhor sorriso ao meu marido.

lembro-me duma enfermeira nova (pela voz, porque continuava sem ver nada) muito simpática a pôr-me o cateter muito suavemente, muitas conversas sobre turnos e trocas de colegas, um doutor espanhol que ia de seguida buscar a filha para a levar a Paris, da dra Joana anestesista, de desviarem várias vezes a minha maca para verem bem o quadro dos turnos e operações (estes gajos deviam ver a Anatomia de Grey para umas ideias mais práticas). lembro-me de todos muito simpáticos a brincarem uns com os outros - foi claramente o intervalo entre cirurgias onde precisavam de desanuviar em grande! lembro-me de pensar que, se me dessem na altura a anestesia, seria sem eu dar por isso, mas de forma muito pacífica.
veio um assistente do dr, também cirurgião, e também assistente do dr no hospital público onde me começou a seguir. apresentou-se, Pedro... com alguma barba, moreno, com uma senhora voz.. claro que eu ... não o consegui ver! ele viu exames, confirmou os sítios onde eu tenho mais dores, pediu desculpa por estarem sempre a confirmar as mesmas coisas..
eu disse: não se preocupe, eu percebo. não leve é a mal se eu o vir na rua e não o cumprimentar, porque sem lentes não vejo nada!
(!!!!!!!!!!!)
[já disse que por esta altura já me tinham dado um calmante há pelo menos uma ou duas horas? acho que se nota]
a seguir entrei na sala de operações, ouvi o meu neurocirurgião a dizer-me para me encostar à beira da marquesa, junto à outra marquesa que tinha dois "rolos" gigantes.
Dr.: É silicone, pode tocar.
Eu: podia ter dito que teria silicone, para lhe pedir para me fazer outras coisas também.
Dr.: Ah, sim? Como o quê?
..e não me lembro de mais nada.
adormeci calmamente e sem aquele nervosismo dos últimos segundos antes de sentirmos a anestesia, e foi bom assim.

dei por mim a tremer, alguém viu e pôs um aquecedor forte entre os cobertores. acordei com aquele quente, muito calmamente e a primeira coisa que fiz foi tentar mexer os dedos dos pés: CONSIGO e SINTO-OS! pouco depois estava a ouvir a voz do A em lágrimas! ele tinha que se ir embora o que me fez saber que a operação tinha demorado muito mais do que o esperado.

na terça tomei duche (abençoado) mas tive grande parte do dia a acordar e adormecer. o A esteve pouco tempo comigo porque parecia pior que eu (homens). o dr disse que me podia ir embora mas disse-lhe que preferia ficar mais um dia.
na quarta um enfermeiro experimentou o primeiro levante - considerando que já tinha tomado duche e ido várias vezes fazer xixi, não sei o que ele quis dizer. passado poucos minutos comecei a ficar muito mal disposta, quase com vomitos e toda a suar estupidamente, a tremer. estava ao telefone com uma amiga e para não a assustar, disse que estavam a bater à porta e desliguei enquanto tocava no botão - a quebra de tensão é muito habitual no pós operatório.
conforme me deitei, perguntei se podia fechar os olhos e adormeci logo.
poucas horas depois chegou o A, depois o almoço, depois a senhora Ana que faz visitas para companhia há mais de trinta anos - algo tão importante e simples que nos esquecemos!
o enfermeiro de Reguengos de Monsaraz tirou o dreno e depois o cateter do pulso e foi muito menos doloroso do esperado. fiquei umas horas sem qualquer medicação e estou viva, sem me contorcer de dores. decidi ficar mais uma noite, não propriamente por me sentir num hotel, mas porque amanhã estarei muito melhor.
os Bichinhos estão bem, tenho falado com eles todos os dias. mas não quero muito falar com ninguém sobre eles.
e a vista do meu quarto é, obviamente, de uma Princesa!

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

what if,!

as questões (só algumas) que estão presentes antes duma operação:
. porque não podemos ter apenas um assunto stressante de cada vez?
. e se eu pertenço à minúscula percentagem de pessoas que morre na sala de operações por motivos que nada têm a ver com a operação? (uma bactéria, uma alergia ou infeção desconhecida, uma cena estupidamente minúscula que ninguém viu)
. e se ninguém se lembra que ela precisa de atenção e de ter o seu próprio tempo sozinha, de mimos e liberdade, de falar as suas histórias como se fossem a mais pura verdade enquanto respondemos como se não o percebessemos? de ser lembrada que a perfeição não é necessária em nenhum momento da nossa vida, que temos direito de perseguir os nossos sonhos, que ela é linda do coração (mas por acaso por fora também) e que as suas verdadeiras pessoas saberão isso? que é das pessoas mais fortes que conheço, que precisa saber que ela é preciosa e deve encontrar pessoas merecedoras da sua presença. que não tem de agradar aos outros. que não é preciso ser sempre forte e que o mano tem pais, que a função dela é ser criança e não se preocupar com nada?
. e se ninguém se lembra que ele precisa de travões constantes mas que lhe digam isso como se a ideia fosse dele? que se precisa também focar nas consequências e não apenas no agora. que é lindo e maravilhoso especialmente no coração (e por acaso por fora também) e que tem de deixar de dizer que é tonto e parvo para se desculpar das ações menos boas, mas mesmo com estas, e se ninguém se lembra de dizer que ele é amado incondicionalmente e se a seguir ele diz que não sabe o que é "amor", lembrar que é gostar muito e sempre? e se não lhe dizem que é muito mais inteligente do que quer mostrar?
. e se ninguém te lembra que não podes desistir mesmo que eu não esteja? em primeiro lugar por ti mesmo e, se isso não for suficiente, pelos nossos Bichinhos. que tens de viver e não apenas sobreviver. que tens e temos sonhos que podes construir e vivê-los mesmo sem mim?
. e se para o outro assunto stressante é preciso mais do que acompanhar e eu, por estar a recuperar, não posso ir fazer exames a apertar-lhe a mão? dizer-lhe parvoíces para sorrir? inventar qualquer realidade do tipo "A vida é bela" para não saber o que se passa?
. e se a operação corre bem a nível de bactérias e alergias mortíferas mas eu fico com mais dores, coxa, mais coxa e mais torta, ou sem conseguir mexer os pés para sempre? e se não conseguir ser feliz assim?
. e se me vou embora e não tive tantas conversas que quereria ter tido?
. e se corre tudo bem e as dores iniciais são insuportáveis?
. se faço um disparate qualquer só para fugir da operação?
. se, por estar com um super senhor herpes ou por hoje ter andado à chuva, fico doente me adiam a operação?
. e se... só de pensar em demasia fico maluquinha?

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

as verdadeiras razões

as verdadeiras razão de ser operada..

. preciso duma cura de sono
. preciso ser mais alta e a regularização dos discos vai dar-me alguns centímetros extra
. preciso dum rabo normal, e endireitar a curva inferior da coluna vai confirmar que afinal o meu rabo não é assim tão espevitado
. preciso de uma cura de sono!

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

datas marcadas

sempre fui muito intensa, sempre vivi, mesmo que apenas dentro de mim, muito intensamente. o que provoca algo muito mau: stress! com datas marcadas tudo aumenta. lembro-me de ser miúda e estar entusiasmada com a chegada do meu aniversário, e parecia que tudo na minha cabeça me fazia lembrar isso: a data que teria de comprar o passe (o anterior ao meu aniversário só porque sim, o posterior porque já teria passado).. e no limite, isto pode levar a algo ainda pior: a insanidade.

a cirurgia, os exames pré-operatórios, a consulta de anestesia: tudo marcado. já marquei o hotel onde os meninos vão ficar nesses dias, já fiz uma limpeza super profunda ao quarto deles, já revi roupas q já não lhe serviam.

antes tenho de...
. ir buscar o resultado da eco da D e mostrar à pediatra,
. ir (eu e o S) a uma consulta de dermatologia e ter certeza que está tudo bem,
.como não sabemos estar quietos, para a semana vêm pintar o meu quarto e a cozinha (e mudar o lavatório de um ex, na esperança de reaver a minha aliança - e ficar com o móvel mais bonito, claro!)
. comprar uma camisa de dormir para mim (nao tenho nenhuma de  inverno porque não  gosto e faz-me frio nas pernas) vai ter de ser gira!
. comprar umas leggings para a D,
. queimar umas cartas que não quero que ninguém veja,
. ter uma semana profissional completamente louca em que já tenho agendado quatro reuniões, dois jantares e um almoço!

será só?

segunda-feira, 2 de outubro de 2017

eu e as minhas costas

aprendi antes dos meus colegas de escola que nas costas, entre outras, existe a zona lombar e a zona sacra. que a zona que une ambas é a lombar-sagrada.

foi depois de uma queda, deveria ter uns douze anos. as dores levaram-me ao médico e ao meu primeiro TAC, donde saí sozinha de camioneta e fui o caminho todo com tonturas (pensei que todos os TAC's provocassem isso). poucos dias depois telefonaram a dizer que tinha de o repetir porque tinha ficado tremido, e aí percebi que os TAC's não dão tonturas.

lembro-me de não ter percebido grande coisa do que o médico disse após ver o exame, e lembro-me que passado alguns dias a minha mãe finalmente ganhou coragem e no meio do caminho entre Almada e o Monte, disse-me que eu teria de ser operada à coluna, mas que só aconselhavam a operação quando já não houvesse nada a fazer: ou seja, quando eu ficasse sem andar.
com o tempo e mais conversas, fui percebendo que tinha uma má formação na coluna, os discos na zona lombar-sagrada estavam mais para dentro do que o normal, que mais cedo ou mais tarde iriam tocar nos nervos e tendões que ligam às pernas e seria nesse momento que ficava sem andar. percebi que achavam que não se devia mexer antes, porque na coluna só se toca em último recurso.
isto foi há mais de vinte anos.
as dores continuaram sempre a piorar e, confesso, ainda fui a um ou outro médico diferente à espera de alguma ajuda, mas eles aconselharam operação, um deles.. com urgência! percebi que a operação já não era vista como último recurso, o problema é que na minha cabeça, sempre continuou a ser.
agora, depois de quatro ortopedistas terem sugerido cirurgia, mais um osteopata, mais dois médicos de clínica geral, mais um neurocirurgião.. e a minha chefe ter-me perguntado directamente quando é que iria deixar de pedir opiniões e aceitar que esse é o caminho... passei pela Neurocirurgia do Hospital Garcia de Orta, e confesso: não gostei do que lá vi, assustei-me e após tantos anos a não querer pensar nisto, tornou-se uma tortura ter de esperar. segui para o Hospital da Luz e o médico encaminhou-me para a CUF Infante Santo.
agora é fazer de tudo para que passe rápido sem pensar demasiado - claro que as enxaquecas diárias fazem-me ter certeza que o stress está altamente presente..

LinkWithin

Related Posts with Thumbnails